Deve haver sempre uma frase a martelar na cabeça antes de se começar a escrever. Agora, devia haver uma que condensasse o futuro, o que não se conhece, de forma a ser possível começar pelo fim, escrever o livro ao contrário. Do fim para o princípio. Queria escrever-vos o primeiro capítulo de tudo o que sei, de tudo o que sei acerca daquilo que quero contar. Mas é óbvio que não sei. Por isso, escrevo para fugir à rotina. Só. Podia passar o dia inteiro a fazer pausas para ir ao supermercado comprar sacos de comida. Podia passar a noite a fazer assados e a abrir garrafas de vinho. Podia passar a madrugada a fumar cigarros e, amiúde, assustar-te colando a cara no vidro que une (ou separa) a sala da varanda. Ris-te sempre. E encolhes os ombros. Claro. Não temos mais nada para fazer senão perguntar, perguntar, perguntar. E esperar. Que venha aí alguma coisa nesse futuro vazio. Será que é sempre tudo igual, ao que já foi, àquilo que já conhecemos? Tento brincar com a minha mãe, pergunto-lhe se é feliz. Diz-me sempre que sim e responde-me com alguma consolação que faz questão de dirigir à geração do desemprego, à geração sem filhos, que vive sozinha e sai ao fim-de-semana, e vai a muitos concertos porque precisa de consumir muita cultura. Cinema, música. E que tenho sorte em tudo. Pois sim, temos todos, todos como eu, o que é muita gente. Então porque nos desgasta o sono? Ninguém sabe, mas fala-se muito disso no café. Preocupamo-nos com o que sonhamos quando estamos sozinhos. Porque nos exalta. Espero, sinceramente, que um dia destes acorde com essa primeira frase. Chamar-lhe-ei primeiro capítulo e será a única razão para as coisas acontecerem sem se sumirem no ar. Por acaso.
(imagem: Susan Bee)
1 comentário:
Tão verdade... Ainda no outro dia estive a falar nisso.. A importancia do estar sempre a questionar tudo leva nos além, contudo tb nos angustia tanto... Espíritos Inquietos: OU se é ou nao se é. ;)
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